O ano de 2022 ficará marcado como um dos anos mais importantes da história recente do Brasil. Diversos acontecimentos previstos ou que já aconteceram neste ano trarão sérias consequências para o país em inúmeras áreas. Certamente, um dos acontecimentos mais relevantes deste ano com certeza serão as eleições que gerarão consequências, por exemplo, no mercado financeiro.
E quais serão as consequências das eleições no mercado financeiro?
A corrida presidencial e as escolhas dos governadores, deputados estaduais, deputados federais e senadores em outubro terão grandes impactos na vida dos brasileiros.
Um primeiro impacto previsto será na dívida pública do país.
Um grande exemplo de como informações relacionadas as eleições podem gerar consequências no mercado financeiro foi o anúncio do programa de governo da chapa Lula-Alckmin.
Por exemplo, no programa, os pontos que tratam sobre mudanças nas regras trabalhistas e no teto de gastos foram aqueles que mais interessaram o mercado financeiro. Eles impactam diretamente na rentabilidade de títulos de renda fixa como, por exemplo, o Tesouro Direto.
Taxa básica de juros e a dívida pública
Certamente, enquanto eventos importantes vão acontecendo no país, como aqueles relacionados as eleições, o mercado financeiro estima a evolução da taxa básica de juros, a Selic. Em outras palavras, este é o conceito dos juros futuros, eles trazem consequências principalmente aos títulos de dívida pública:
- 1)Tesouro Selic: empréstimo para o governo federal vinculado à taxa Selic.
- 2)Tesouro Prefixado: empréstimo para o governo federal com remuneração baseada em uma taxa definida no início do investimento.
- 3)Tesouro IPCA + (ou NTN-B Principal): empréstimo para o governo vinculado à inflação oficial do país.
- 4)Tesouro IPCA + com juros semestrais (ou NTN-B): empréstimo para o governo vinculado à inflação oficial do país com remuneração semestral.
Tesouro Direto e suas oscilações de preço
O Tesouro Direto é o título de renda fixa vinculado à dívida pública e que apresenta oscilações diárias de seu preço.
Estas oscilações estão relacionadas a Selic e são determinadas pelo preço dos contratos de juros futuros negociados na Bolsa de Valores, a B3.
A marcação do preço diário é reflexo do juro que o mercado espera para a data de vencimento do contrato.
Consequências das eleições na dívida pública
Certamente, em relação aos fatos que mais influenciam nos preços dos títulos da dívida pública, as eleições são extremamente importantes, pois o resultado trará consequências, por exemplo, o futuro da política monetária do Brasil.
Por exemplo, no caso de o mercado financeiro prever um cenário na qual o presidente eleito pode decidir alterar políticas que estão dando certo, principalmente do ponto de vista fiscal, a consequência será uma estimativa de queda do preço dos ativos prefixados e aumento dos juros futuros.
Por outro lado, quando a previsão do mercado financeiro é de um cenário onde o eleito terá decisões no sentido de fazer bem a economia, a consequência será uma estimativa dos juros futuros tendendo a queda, entendendo que o Banco Central conseguirá controlar a inflação e abaixar os juros.
Desta forma, neste cenário mais otimista, como os juros esperados para o vencimento do título serão menores do que a rentabilidade entregue no seu encerramento, o preço do ativo prefixado tenderá a subir.
Consequências das eleições nos ativos pós-fixados
Para os ativos pós-fixados vinculados ao IPCA e à Selic, a estimativa do mercado financeiro definirá os preços.
No cenário na qual o mercado estima juros e inflação mais baixos e desta forma, os ativos prefixados mais atrativos, os ativos pós-fixados como: Tesouro Selic, Tesouro IPCA e Tesouro IPCA+ serão muito provavelmente menos procurados, diminuindo os preços.
Para pensarmos nas consequências das eleições e a relação com os títulos de dívida pública, precisamos refletir sobre qual cenário eleitoral mais vai influenciar na política monetária dos próximos anos e, consequentemente, no mercado financeiro.
Como o mercado financeiro tenta prever o resultado das eleições?
Quanto mais se aproximam as eleições, mais pesquisas eleitorais são realizadas. Juntamente com as pesquisas, o mercado financeiro também elabora modelos estatísticos para tentar prever o resultado eleitoral e as consequências.
Um dos cenários com maiores chances, segundo estas estimativas, é que as intenções de voto do atual presidente Jair Bolsonaro devem crescer até o primeiro turno.
Este cenário leva em consideração os pagamentos das parcelas do Auxílio Brasil, o resultado do PIB maior do que o esperado no início do ano e a queda no desemprego.
A disputa do primeiro turno, seguindo este cenário, deve ser muito acirrada entre o atual presidente Bolsonaro e o ex-presidente Lula.
Essa estimativa baseia-se em cálculos matemáticos efetuados internamente em gestoras e bancos, na qual, segundo fontes do mercado, não divergem muito entre si. Entre eles, dois modelos são reconhecidos e respeitados pela grande acuracidade, o da XP e o do Itaú Unibanco que apontam para o mesmo cenário.
Segundo uma nota do Itaú, afirma que em suas simulações avalia como as variáveis econômicas influenciam nas intenções de voto.
Existe um padrão
Nestas simulações repetem um padrão bem conhecido no Brasil e internacionalmente cujas indicações mostram melhoras nas intenções de voto do governo atual quando há melhora no crescimento econômico e redução da inflação. Certamente, da mesma forma mostra redução nas intenções de voto do governo com aumento da inflação e desaceleração econômica.
Em suma, as simulações do mercado financeiro analisam o quanto os dados econômicos interferem diretamente na popularidade do presidente. Além disso, consideram as estimativas de inflação e do PIB, utilizando também como base a faixa média salarial e a taxa de desemprego.
Porém, os responsáveis pelas simulações reconhecem que existem outras variáveis que podem aparecer de forma imprevisível. Da mesma forma como os acontecimentos que ocorreram próximos das eleições em 2018 e trouxeram consequências inesperadas inclusive para o mercado financeiro.
As medidas do governo em 2022 que podem bagunçar o mercado financeiro e trazer consequências ruins para o futuro do Brasil
Por exemplo, os investidores de bolsa de valores, compram e vendem ações, títulos públicos, dólares e diversos outros ativos de acordo com suas estimativas sobre o futuro da economia do país.
No Brasil, a cada quatro anos as pesquisas de intenções de voto, juntamente com a taxa de desemprego e o índice de inflação se transformam em indicadores com influências nas eleições.
Estes indicadores são utilizados para justificar as mudanças nas taxas de juros, bruscas alterações no câmbio e as altas oscilações do Ibovespa.
Entretanto, as pesquisas eleitorais são o dado mais palpável que o mercado tem para o que chamam de incerteza eleitoral.
É possível afirmar que o mercado financeiro sabe, durante os três primeiros anos de um mandato presidencial, mais ou menos o que esperar do presidente, independente das questões ideológicas. A partir disso tomam suas decisões sobre investimentos.
Porém, muita coisa muda no quarto ano de mandato, no ano eleitoral, quando inicia a nova campanha eleitoral o mercado precisa acertar: 1) quais projetos serão vencedores e 2) quem sairá vencedor no pleito.
Esta influência das questões eleitorais no mercado financeiro é muito comum nos países de regime presidencialista. Assim como acontece no Brasil, nos Estados Unidos, por exemplo, também existe grandes consequências na bolsa de valores americana em ano de eleições presidenciais.
O Brasil não é para amadores
Entretanto, como muitos de nós sabemos, o Brasil não é para amadores, principalmente quando tratamos de política.
Por exemplo, aqui no Brasil, o atual presidente Bolsonaro passou quase o mandato inteiro questionando as urnas eletrônicas, em conflito quase constante com os ministros do Supremo Tribunal Federal, enquanto entregava o controle do orçamento para o Congresso com a distribuição de emendas na intenção de barrar possíveis investigações de corrupção de seu governo.
Assuntos como golpe militar, fechamento do congresso e dissolução do STF também ganharam destaque nas mídias durante boa parte do governo, alimentados muitas vezes pelas falas do próprio presidente.
Mais recentemente, algumas fontes noticiaram que existiria até boatos sobre a intenção do governo em tentar adiar as eleições.
Com tantas notícias sérias e que podem influenciar diretamente o futuro democrático do país, houveram manifestações a favor e contra de todos os lados da política, das entidades, da elite, da população, do judiciário. Certamente, não faltaram nestes últimos anos, conflitos e tensões que geraram diversos períodos de instabilidade.
Uma das mais recentes medidas adotadas pelo governo, que foi capaz de influenciar diretamente as grandes oscilações do câmbio e da bolsa, foi a aprovação do pacote bilionário de transferência de renda durante o período eleitoral. Mais de R$ 40 bilhões aprovado em tempo recorde e que derrubou os pilares que não permitiam o uso político do Estado em uma campanha de reeleição.
Em suma, esta medida meses antes das eleições trouxe sérias consequências, pois acabou com a sustentabilidade das contas públicas no longo prazo, o que já começou afetar o mercado financeiro.
Qual será o tema principal nestas eleições?
Em todas as eleições temos temas, em 2018 foi a “nova política”, este ano será a economia.
Inflação crescente, combustíveis com preços nunca vistos, valor dos alimentos impactando cada vez mais no bolso dos brasileiros. Com esta combinação tão danosa para população, é impossível evitar que os brasileiros passem mais tempo fazendo contas, tentando fazer com o que o salário dure até o final do mês, ao invés de se preocupar com as denúncias de propina.
Para grande parte da população o que esperam é apenas o mínimo: que o governo faça algo para aliviar a situação econômica atual.
Com isso, como algo normal, o governo resolveu agir para ganhar votos, decidiu fazer alguma coisa nos últimos meses de governo, porém, sabemos que existe uma grande diferença entre fazer alguma coisa e fazer qualquer coisa.
Interferindo diretamente na chamada PEC Kamikaze, o governo federal conseguiu que a emenda à constituição, que liberou a emissão de mais de R$ 40 bilhões em dívidas para pagar benefícios sociais durante o período eleitoral, fosse aprovada no Congresso. Esta PEC terá validade apenas até o fim do ano e beneficiará algumas parcelas da população.
Esta emenda era realmente necessária?
Certamente, não há dúvida que existem milhões de brasileiros precisando de auxílio financeiro atualmente, entretanto, o grande problema é que esta medida não foi apenas um “drible” na lei eleitoral, mas também terminou de destruir o teto de gastos do país.
O teto de gastos criado durante o governo Temer para limitar o crescimento das despesas públicas e diminuir a dívida pública foi destruído definitivamente por esta medida.
Outro exemplo, além desta medida houve outra também de grande impacto para as contas públicas, na tentativa de aumentar a aprovação do governo, como: a limitação de 17% na cobrança do ICMS nos combustíveis, telefone e nas contas de luz, diminuindo os preços para população no curto prazo, mas deixando o rombo para os governadores, para piorar, esta medida é permanente.
E as consequências das eleições no longo prazo?
“Não existe nada mais permanente do que um programa governamental temporário.”
Milton Friedman, ganhador do prêmio Nobel de economia.
O ministro Paulo Guedes provavelmente pensou nesta frase de Friedman quando inicialmente chamou de Kamikaze a PEC dos auxílios, porém, como pegou mal, mudou de ideia e disse que era a “PEC virtuosa das bondades”.
Seja qual for o nome que se dê, o fato é que ela tem um caráter suicida para as contas públicas capaz de impactar gerações.
A PEC criou auxílios temporários com grande impacto nas contas públicas. Apesar disso, Lula já afirmou que se for eleito manterá o aumento do Auxílio Brasil em 2023, e Bolsonaro reforçou que manterá durante seu novo mandato se for reeleito.
Certamente, não há dúvida que existe um consenso sobre a gastança tanto entre a situação quanto na oposição, pois o resultado da votação da PEC na Câmara foi: 469 deputados a favor e apenas 17 contrários. No Senado apenas 1 voto contra.
E este fato é apenas política? Claro que não. O mercado financeiro balançou, dólar voltou a subir, juros também, a bolsa acompanhou o pessimismo e caiu abaixo dos 100 mil pontos.
Existe o direito de gastar em prol das eleições?
Na economia existe algo que impede os governos de se endividar indefinidamente para produzir auxílios, a inflação. Para o cidadão comum, se gasta mais do que ganha entra no cheque especial e fica devendo para o banco. Para o governo não existe este problema, teoricamente podem criar dinheiro indefinidamente.
Porém, esse dinheiro vai para economia e aumenta a demanda por produtos e serviços. Sem o aumento na oferta, os preços sobem. Se existe limite de oferta (como o mundo pós-pandemia) a situação fica ainda pior.
Com isso é possível entender o porquê a inflação brasileira atingiu valores que não se via desde 2003, superando o pico que o governo Dilma atingiu (10,7% em 12 meses em janeiro de 2016).
A comparação entre o final do governo Dilma e o final deste governo de Bolsonaro é inevitável. Antes tínhamos a lei de responsabilidade fiscal que o governo Dilma acabou, agora tínhamos o teto de gastos que o governo Bolsonaro destruiu.
As consequências do governo Dilma conhecemos muito bem, foram anos pagando a conta, agora, estão repetindo este grande erro com valores muito maiores.
Os efeitos são semelhantes, se o governo pede mais dinheiro para gastar, mais cedo ou mais tarde os investidores cobrarão juros mais elevados para aceitar o negócio. É o medo do risco que em algum momento a bola de neve ficará impagável.
E quais são as consequências destes gastos?
Estes efeitos são capazes de acabar com o que ainda restava de confiança na economia do país. Tanto é verdade que economistas já repetem que o próximo governo, seja qual for, terá que definir um “novo teto de gastos”. Porém, não seria como o que existia, mas seguindo o mesmo princípio.
Em suma, a ideia principal do teto de gastos é que exista algum instrumento limitador para impedir gastos sem controle e assim faça com que investidores voltem a financiar o governo por juros mais amigáveis. Sem este limitador capaz de segurar os gastos do governo, os mais pessimistas preveem juros em torno de 20%.
Como efeitos colaterais, devido aos altos juros, não há investimentos relevantes, com isso tornando-se um problema crônico no país nos últimos anos. A economia do Brasil não melhora sua infraestrutura e não desenvolve tecnologias, consequentemente teremos queda de produtividade e falta na criação de empregos.
E como podemos mudar este jogo?
Certamente, para mudar este jogo dependemos de elevados investimentos, porém, sem dinheiro do Estado, o investidor privado precisa participar, entretanto, ele não participará porque prefere emprestar dinheiro para o governo em troca dos altos juros.
Em suma, muito em breve a bomba fiscal que já foi armada vai estourar. A alta arrecadação com commodities pós-pandemia depende dos ciclos econômicos e vai diminuir gradualmente, o setor de serviços que também ajudou a amenizar as contas vai perder força com a alta dos juros, o grande número de contribuintes pagando recordes de imposto também vai desacelerar.
O crescimento da economia este ano não passará de 2%, em 2023 teremos estagnação ou até mesmo recessão.
Certamente, o próximo governo, seja qual for que virá em 2023 já iniciará sem a confiança do mercado financeiro, pegando a economia ainda mais frágil e com a bomba fiscal prestes a estourar, também enfrentará incertezas e possível crise internacional.
Como consequência da PEC Kamikaze o dólar foi a R$ 5,50, felizmente ainda abaixo dos R$ 5,57 do final do ano passado, uma boa notícia, mesmo com a destruição do teto de gastos a economia manteve uma certa estabilidade.
Porém, no médio e longo prazo, para a economia continuar assim é preciso haver manutenção do teto.
Em conclusão, será necessário que o próximo governo utilize os recursos públicos com mais eficiência, garantindo assim um futuro mais próspero, onde qualquer fato relacionado a golpe de estado permaneça apenas nos livros de história.
Por outro lado, caso contrário o Brasil pode sim, seguir o mesmo rumo da Argentina ou até mesmo da Venezuela, com isso teríamos sem dúvida alguma um Brasil Kamikaze.